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Leonardo Sakamoto

Você concorda com a Reforma da Previdência proposta por seu candidato?

Leonardo Sakamoto

17/08/2018 05h50

Bruna Prado/UOL

A discussão sobre a Reforma da Previdência, proposta por Michel Temer, acabou abortada quando o governo teve que destinar todas suas energias para garantir a própria sobrevivência após as gravações de Joesley Batista virem a público, comprometendo o presidente.

Nos últimos dois anos, defendi que este governo federal e o atual Congresso Nacional não contam com legitimidade suficiente para levar adiante essa discussão pelo fato dessa agenda não ter sido discutida, votada e eleita em 2014. Sua aprovação forçada seria, portanto, um estelionato eleitoral. Até maior que o do governo Dilma – que, após criticar duramente as políticas de austeridade durante a campanha, adotou essa cartilha ao raiar de seu segundo mandato.

Além disso, não houve debate com a sociedade para a realização dessa reforma. Pelo contrário, governo e setores da política e do mercado tentaram atropelar as opiniões contrárias com o rolo compressor do medo – se a reforma não ocorresse naquele momento, as estrelas iriam cair e o sol, apagar-se. E só não conseguiram porque o governo gastou todos os recursos e tempo que tinha para livrar seu pescoço da guilhotina das denúncias criminais.

Daí, ao entrarmos no ano eleitoral, os deputados federais paralisaram o trâmite considerando as altas taxas de impopularidade da reforma junto aos trabalhadores e o fato de que desejam se reeleger.

A Reforma da Previdência deveria fazer parte de uma discussão ampla sobre o projeto de país que queremos. Isso significa que os candidatos precisam apresentar suas propostas para a área da forma mais clara e detalhada possível a fim de que seja amplamente entendido e debatido.

Em algumas sabatinas e entrevistas realizadas, quando havia mais tempo para a construção de ideias complexas, até houve algumas explicações de alguns candidatos. Mas poucos foram os momentos em que se ouviu uma tentativa de explicar ao povão, e não apenas a grandes empresários e ao mercado, como vão mexer nas aposentadorias. Isso, de certa forma, lembra bastante o que ocorreu no governo Temer, em que o presidente visitou vários eventos do poder econômico, mas pouco falou em reuniões de trabalhadores.

Os candidatos e candidatas à Presidência da República vão propor uma Reforma da Previdência? Quanto tempo a mais as pessoas terão que trabalhar? Com qual idade mínima elas se aposentarão? Quanto tempo de contribuição para obter a pensão mínima e quanto para o teto? Haverá mudança no benefício social dos idosos pobres? E na aposentadoria especial rural? Como funcionará uma regra de transição? Quais serão os sacrifícios ampliados sobre os que ganham menos e quais os privilégios mantidos para os que ganham mais? Haverá debate público antes de tudo isso ou vai ser meia dúzia de iluminados decidindo pelo restante de nós?

Tudo deveria ser explicado em português claro e não em economês empolado – que, para a maioria dos trabalhadores, não é muito diferente do sânscrito ou do aramaico. Os debates eleitorais na TV seriam um excelente momento para discutir o tema, caso contassem com um formato que privilegiasse o aprofundamento de questões de interesse da população ao invés de uma fórmula voltada à produção de memes e à geração de piadas para as redes sociais.

Com o formato batido – de perguntas, respostas, réplicas e tréplicas curtíssimas, insistindo em debates não-temáticos que repetem os mesmos assuntos em diferentes emissoras, com mediadores que servem para controlar o tempo e o direito de resposta ao invés de cortarem, com duras cobranças, os candidatos que fugirem das questões – fica difícil construir algo sólido com o eleitor.

Poderia haver um debate inteiro apenas sobre Geração de Emprego e Reforma da Previdência, por exemplo. O problema é que essa proposta certamente seria barrada por certas candidaturas.

Há quem vote em candidatos sem conhecer seus projetos para áreas sensíveis. Preferem acreditar que ele ou ela fará tudo ao seu alcance para garantir qualidade de vida e ponto. Entregam, portanto, um cheque em branco. Ao fazer isso e aceitar que "linhas gerais" sejam apresentadas como programas de governo, atuam como fãs, não cidadãos.

Um erro que, mais cedo ou mais tarde, cobra seu preço.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.