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Leonardo Sakamoto

O caso Bebianno-Bolsonaro se tornou um barraco de ZapZap e redes sociais

Leonardo Sakamoto

19/02/2019 18h13

Bolsonaro desiste de publicar o vídeo que havia feito para expressar como Bebianno foi importante à sua campanha e seu governo em suas redes sociais, deixando para outras pessoas, com menos seguidores, postarem. Bebianno retira foto em que aparecia com Bolsonaro de seu Instagram e coloca uma em que está com uma arma. Vazam diálogos entre ambos no WhatsApp. Lembrando que tudo começou quando seu filho, Carlos, humilhou Bebbiano no Twitter, chamando-o de "mentiroso", com o consentimento do pai. Que, ainda por cima, retuitou.

Parece que a nova forma de fazer política se parece com um barraco, daqueles bem ordinários, nas redes sociais.

O WhatsApp não apenas ajudou a eleger Jair Bolsonaro como tem sido, ao lado das redes sociais, o canal usado por ele para se comunicar com a sociedade, construindo seu universo simbólico paralelo, apontando vilões e mocinhos. Através de mensagens e postagens, não raro contradiz o que havia acabado de dizer, desmente ministros, ignorando problemas – e fica por isso mesmo. Por isso, não deixa de ser irônico que os personagens da primeira grande crise política pela qual o governo está passando sejam exatamente o aplicativo de mensagens e as redes sociais.

Depois dos petardos via Twitter, da semana passada, nesta terça (19), 13 áudios das conversas entre ele e o ex-amigo, ex-advogado, ex-fã e ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, vieram a público, mostrando que ambos conversaram quando o presidente ainda estava internado no hospital Albert Einstein. Bebianno havia sido chamado de mentiroso pelos Bolsonaros porque dissera à impresna que havia falado com o presidente três vezes no dia 12 e que estava tudo bem.

A pior mentira, claro, era de que estava tudo bem, uma vez que uma investigação da Folha de S.Paulo havia apontado seu envolvimento na autorização da irrigação de um laranjal de candidaturas do PSL com recursos públicos na última campanha, quando estava como presidente nacional do partido.

Bolsonaro sustentou nas próprias mensagens que conversar por texto e áudio, via WhatsApp, não é mesma coisa que "falar", então Bebianno teria mesmo mentido – uma discussão sem sentido. Além disso, o mais relevante é o fato de que Bolsonaro fez bullying público em alguém próximo – um comportamento que se espera de Jairzinho, menino de seis anos que entra agora na escola e é desprovido de algumas ferramentas básicas de convivência social, e não de Jair Bolsonaro, presidente do país.

Após entregar, ao Congresso Nacional, seu pacote de propostas legislativas contra o crime organizado e a corrupção, mas não tanto contra o Caixa 2 (pior que corrupção para juiz Moro juiz, mas mais leve para o ministro Moro), o ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro, afirmou que "no mundo real não existe nenhuma crise no governo". Segundo ele, como o governo está apresentado projetos (hoje, o seu, amanhã, o da Previdência) tudo está correndo bem.

Ele está no seu papel de defender a equipe ao qual pertence. Mas, neste exato momento, a dúvida não é se há crise, mas se há governo de fato. Porque quando um presidente da República usa seu filho, vereador da capital carioca, para atingir um ministro que considerava braço direito, via humilhação na rede social, ao invés de conversar diretamente e aceitar suas explicações, esperar investigações e arcar com o ônus ou demiti-lo de uma vez, temos uma Casa da Mãe Joana, não uma gestão que diz que veio mudar tudo o que tá aí, talkey? No mundo real, as pessoas precisam de soluções rápidas para reduzir a violência e não um projeto que deve trazer "danos colaterais" na forma de mais gente pobre morta.

Um governo que não está sendo capaz de construir uma base parlamentar sólida no Congresso Nacional para aprovar tais projetos. Pelo contrário, manda sinais extremamente negativos: de que o presidente e seus filhos são capazes de abater em pleno voo seus aliados mais próximos. Isso, claro, coloca em dúvida sua capacidade de agir como representante do país.

E, hoje, sofreu sua primeira derrota em plenário, quando a Câmara votou pela derrubada da efetividade do decreto que restringe a Lei de Acesso à Informação, possibilitando que cargos comissionados definam documentos como secretos e ultrassecretos. O texto agora vai ao Senado. Representantes do centrão, que uniram à oposição, afirmam que isso é consequência da dificuldade de diálogo com o governo. Ou seja, falta da caneta cheia de tinta do Poder Executivo para nomear A, B e C em cargos pela administração.

Neste momento, o governo deveria estar discutindo amplamente a Reforma da Previdência com a sociedade – dialogando, não despejando publicidade para convencê-la de que sua ideia é melhor, pura e simplesmente. Mas parece que o processo vai ser mesmo bastante confuso e de empurra-empurra por que o governo não consegue nem se entender com o Congresso, que dirá com os diferentes grupos de trabalhadores. As eleições deveriam ter sido o momento para um debate democrático, mas preferimos tratar do futuro da mamadeira de piroca e da Venezuela, além de outros não-assuntos plantados por mensagens enganosas pelo WhatsApp.

Os áudios das conversas via WhatsApp são apenas o aperitivo bobo. Bebianno, o novo "homem-bomba" da República, tem muito mais o que mostrar se quiser. Por exemplo, pode falar sobre o financiamento dos disparos de milhões de mensagens por empresários simpatizantes da campanha presidencial. O barraco entre os agora ex-amigos Bolsonaro e Bebianno nas redes sociais pode render novos capítulos. Esperemos que eles sejam úteis para dar mais transparência à administração pública. Fiquemos atentos. Quando um der block no outro, vai ser a guerra.

Em tempo: e os áudios não vazados, o que continham?

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.