Topo

Leonardo Sakamoto

Provocações de atos pró-Bolsonaro devem inflar protestos no dia 30

Leonardo Sakamoto

26/05/2019 18h47

Manifestantes pró-Bolsonaro arrancam faixa em defesa da educação em Curitiba. Foto: Giorgia Prates/Jornal Plural/UFPR

As manifestações em defesa de Jair Bolsonaro, neste domingo (26), não foram desprezíveis, mas também não ultrapassaram os protestos de estudantes e professores do último dia 15, tendo menos capilaridade que eles. Como resultado, teremos uma semana de guerra de narrativas nas redes sociais entre grupos pró e contra o governo  – e, consequentemente, o aumento da polarização.

Como as ruas não vieram no tamanho que o presidente esperava, aguarda-se o comportamento do centrão, transformado em vilão, e de Rodrigo Maia, renascido como uma mistura de Lula e Gilmar Mendes, nos corações bolsonaristas.

Independentemente disso, elas devem trazer um resultado imediato: aumentar os protestos marcados por estudantes e professores e apoiados por movimentos sociais, na próxima quinta (30), contra os cortes na educação.

As imagens de manifestantes arrancando uma enorme faixa que dizia "Em defesa da educação" do Prédio Histórico da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba, foram recebidas com repúdio nas redes mais progressistas e liberais. Repórteres que registravam a cena foram agredidos de forma covarde. A autora da imagem acima, a fotógrafa Giorgia Prates, confirmou a este blog que foi uma das agredidas.

Ricardo Marcelo Fonseca, reitor da UFPR, postou uma foto mostrando a cena em sua conta no Twitter: "Neste exato momento manifestantes retiraram, com muitos aplausos, uma faixa no Prédio Histórico da UFPR em que estava escrito: "Em defesa da educação". Inacreditável".

Também não foram bem digeridos os cartazes cutucando estudantes e professores, afirmando que "quem trabalha protesta ao domingo" – mesmo que professores que foram aos atos sem a liberação das escolas tenham tido seus pontos cortados. Ou as entrevistas de manifestantes dizendo que a mídia e estudantes mentem descaradamente ao falarem em cortes no orçamento da educação. Ou, ainda, os comentários de influenciadores digitais da extrema direita provocando as organização dos atos do dia 30.

"O fracasso da tática do bolsonarismo deixa claro que o governo perdeu apoio social e pode ser derrotado nas ruas. Isso representa uma derrota ao governo e dá mais força para a mobilização do dia 30", afirmou ao blog Guilherme Boulos, coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto. Ele avalia as manifestações de hoje como "pouco expressivas, com exceção de SP e RJ e, mesmo assim, menores que o dia 15". Diz que Bolsonaro esperava e precisava de muito mais.

Some-se a isso o fato de que as manifestações não decepcionaram e contaram com a cota de doidos autoritários e golpistas pedindo a morte do Supremo Tribunal Federal e prisões de seus ministros, cassação de parlamentares e, claro, a velha "intervenção militar constitucional" – vulgo golpe. Sem falar das indefectíveis faixas "Olavo tem razão" – que funcionam como uma autodeclaração de insanidade. A maioria trazia pautas legítimas, como as reformas. Mas as ilegítimas estavam lá.

Pelos relatos dos colegas que chegam de todo o país, houve mais manifestantes que rechaçaram a presença da imprensa do que a do naco de malucos que protestavam contra a democracia.

Isso mostra que o Bolsonarismo-raiz, aquele pessoal que está com o capitão para o que der e vier, que não votou nele apenas pelo antipetismo, mas por consciência do que Jair Messias representa foi às ruas. Fazem barulho, mas (ainda) não o bastante para assustar como a convulsão do impeachment em 2015 e 2016. E a depender do que aconteça com a economia, é provável que nem venham a fazer.

A reprovação do governo Bolsonaro ultrapassou nominalmente a aprovação na última pesquisa XP/Ipespe. A somatória de "ruim e péssimo" atingiu 36% e o "ótimo e bom" chegou a 34%. Desde o início do ano, a reprovação passou de 20% para 36% e a aprovação de 40% para 36%. Para um presidente que se preocupa mais com golden shower e com nazismo de esquerda do que com empregos e não coloca alguém competente para administrar a educação, a queda ainda é pequena.

Apesar de terem reunido um bom público nas avenidas Paulista, em São Paulo, e Atlântica, no Rio, as manifestações em defesa do governo tiveram menos capilaridade que os protestos contra os cortes na educação no último dia 15 de maio. Estes se estenderam por 222 municípios em 26 estados e no Distrito Federal. Neste domingo, foram 156 municípios, também em todo o país, de acordo com o levantamento do portal G1. Na Paulista, o ato se concentrou em três quarteirões e teve manifestantes espalhados de forma discreta por outros sete, enquanto a manifestação convocada por estudantes e professores lotou quatro quarteirões. A diferença é que a anterior saiu em marcha depois da concentração e a de hoje, não.

Bonecos de Rodrigo Maia e de Lula no Rio. Foto: Pauline Almeida/UOL

Ao eleger o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, como o grande vilão, ao lado do "centrão", as ruas deram a ele o direito a um pixuleco só seu ao lado do inflável de Lula no ato do Rio de Janeiro. Quase ao mesmo tempo, durante um culto na capital carioca, Bolsonaro dizia que as pessoas foram às ruas com o "propósito de dar recado àqueles que teimam com velhas práticas não deixar que esse povo se liberte". Analisando o contexto, o presidente acusou deputados que podem votar em seus projetos de escravizarem a população.

Não sabemos se era a intenção do presidente terminar de implodir as pontes com o parlamento, mas talvez ele tenha conseguido.

Os atos foram insuficientes para Bolsonaro mostrar que pode governar passando por cima do parlamento e da oposição na sociedade, mas o bastante para mostrar que ele conta com certo apoio. As reações, agora, estão com o Congresso e com os insatisfeitos na sociedade. E não prometem ser tranquilas para o presidente.

Talvez ele prefira assim. Uma pessoa que sempre promoveu a guerra não consegue governar costurando paz.

Enquanto isso, como já disse aqui, uma maioria da população que não sairia para protestar nem contra, nem a favor do governo, segue preocupada se vai conseguir trabalhar amanhã para alimentar a família em um país que conta com 13,4 milhões de pessoas que procuram serviço e não acham. E um governo, que continua mais preocupado em estimular "manifestações espontâneas" do que lançar uma política nacional para fomento de emprego e renda no país.

Post atualizado às 22h27, do dia 26/05/2019, para inclusão do número final de cidades com manifestações bolsonaristas.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.