Moro assume parcialidade ao defender FHC para a Lava Jato, dizem juristas
Questionado a respeito de um diálogo com o procurador Deltan Dallagnol sobre suspeitas contra o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, divulgado, pelo site Intercept Brasil, Sérgio Moro afirmou que o caso não era dele. "Qual era é a prova que eu fiz alguma coisa?", disse em audiência no Senado Federal nesta quarta (18). Professores e pesquisadores da área do Direito ouvidos pelo blog afirmam, contudo, que a declaração demonstra parcialidade política do então juiz federal responsável pela operação Lava Jato.
Na conversa, de 13 de abril de 2017, Moro questionou Dallagnol se havia "alguma coisa mesmo séria do FHC", após reportagem do Jornal Nacional do dia anterior que mostrava o ex-presidente sendo citado em delação da Odebrecht. Ele responde que a princípio o conteúdo seria fraco e antigo e que foi enviado para São Paulo sem analisar se estava prescrito ou não. "Suponho que de propósito. Talvez para passar recado de imparcialidade", afirmou o procurador, segundo o diálogo divulgado.
Moro então se posicionou contra a investigação de FHC, não pela prescrição, mas pelo tucano ser apoiador da Lava Jato: "Ah, não sei. Acho questionável pois melindra alguém cujo apoio é importante". O caso acabou sendo considerado prescrito e arquivado.
Na audiência na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, Moro afirmou que a ação saiu de Brasília e foi para São Paulo, sem passar por Curitiba. Disse que o diálogo pode ter existido, mas não sabe se o conteúdo foi adulterado, defendeu-se novamente ("foi um comentário de alguém que não tem o processo") e atacou o Intercept, que chamou de "sensacionalista" e "duvidoso".
O senador Humberto Costa (PT-PE) afirmou que o magistrado tentou interferir junto à força tarefa da Lava Jato em um processo que nem era dele para que uma outra pessoa fosse beneficiada. O ministro da Justiça e da Segurança Pública afirmou que considerou essa e outras declarações de Costa ofensivas e não quis respondê-las.
"Uma vez comprovada a legitimidade desses diálogos, eles reforçam o argumento de suspeição." A avaliação é de Maíra Cardoso Zapater, professora de Direito Penal e pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre o Crime e a Pena da FGV Direito. De acordo com ela, a questão não é ser o juiz ou não do caso, mas a demonstração de parcialidade.
"Há uma tentativa de levar elementos de fora dos autos, de natureza política, que não deveriam estar lá." A questão neste caso, segundo ela, é que, confirmados os diálogos, Moro mostra que estava atuando de forma política.
Quem segue a mesma linha é a professora da FGV Direito e coordenadora do centro de pesquisas Supremo em Pauta, Eloísa Machado de Almeida. "Sobre a Operação Lava Jato sempre recaiu a sombra de agir seletivamente, com motivação política específica. As mensagens reveladas, caso verdadeiras, comprovam essas parcialidade e seletividade, características que atacam o centro da noção de Estado de Direito."
Durante a audiência na Comissão de Constituição e Justiça, o senador Cid Gomes (PDT-CE) propôs que o Congresso Nacional altere a legislação para garantir que "o juiz que instrui o processo não seja o mesmo que irá julgar o crime". Segundo ele, "isso evitaria toda a polêmica que estamos vivendo hoje".
Alamiro Velludo Salvador Netto, advogado criminalista e professor titular do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, defendeu ao blog a mesma medida. "O processo brasileiro tem um grave e histórico problema que é apontado pela academia. O juiz que participa de atos de investigação não deveria ser o juiz que julga o mérito do processo. O Brasil não fez essa reforma, o que nos coloca de maneira refratária em face a todo o mundo."
Para Alamiro, confirmados os diálogos, "a posição do ministro Moro coloca em xeque qualquer viabilidade de sustentação jurídica das condenações que proferiu".
O senador Cid Gomes também propôs que sejam abertas duas investigações no Congresso Nacional: uma para descobrir quem está por trás da obtenção dos diálogos envolvendo Sérgio Moro e os membros da força-tarefa da Lava Jato. Outra para verificar se houve conluio entre os Poderes Judiciário e o Ministério Público, ou seja, entre Moro e os procuradores no curso da operação.
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