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Leonardo Sakamoto

Bolsonaro governou para seus fãs e deixou queda do desemprego de lado

Leonardo Sakamoto

08/07/2019 12h53

Manifestação pró-Bolsonaro na avenida Paulista, em São Paulo, no dia 26 de junho. Foto: Nelson Almeida/AFP

Bolsonaro, ao longo dos primeiros seis meses de seu governo, fortaleceu a relação com seus fãs, tentando entregar a eles a distopia de extrema direita que defendeu por anos. Em troca, espera fidelidade para que defendam seu governo – mesmo que parte dessas medidas tenha sido bloqueada pelo Congresso ou o Supremo Tribunal Federal. Tanto que o apoio à sua gestão cresceu junto a esse público e também entre os mais ricos (de 41% para 52%, entre quem ganha mais de dez salários mínimos), enquanto a rejeição aumentou entre outros grupos. Hoje, 33% da sociedade acha que está tudo indo bem, 31% espera para ver o que acontece e 33% considera que ele está mandando mal, de acordo com a pesquisa Datafolha, divulgada nesta segunda (8).

Os números vão ao encontro da última pesquisa Ibope, divulgada no dia 27 de junho, na qual 32% da população considerava o governo ótimo ou bom, 32% regular e 32% avaliam-no como ruim e péssimo. O presidente conseguir dividir o país não em dois, mas em três. Ele chegou ao seu piso, como o PT tem o seu? Difícil dizer com uma série histórica tão curta.

A situação é transitória e depende, acima de tudo, da economia. A Bolsa de Valores sobe na expectativa da aprovação da Reforma da Previdência, mas isso não se traduz em mudanças significativas no mundo real. A estimativa de crescimento do PIB deste ano continua caindo e os empregos gerados são precários e de baixa qualidade ao mesmo tempo que insuficientes para reduzir significativamente tanto a população desempregada quanto a subutilizada, na casa dos 28,5 milhões.

Se o país voltar a crescer e seu vigor reduzir de forma drástica a taxa de desocupação, criando postos de trabalho formais e aumentando a renda média do trabalho, haverá reorganização desses terços, com aumento da aprovação do governo. Mas, se isso acontecer, não será por mérito do governo – que, por ignorância, despreparo e arrogância, passa por cima dos preceitos básicos da gestão pública, da democracia e da civilidade. Será mérito tanto de articulações republicanas quanto do fisiologismo de sempre no Congresso Nacional.

Para uma imensa quantidade de trabalhadores, o presidente poderia até empreender a cruzada ideológica que quisesse, desde que melhorasse primeiro a qualidade de vida. Lembremos da onda que atropelou as denúncias do Mensalão e reelegeu Lula em 2006 diante de uma economia em crescimento. O grosso da população pobre não é de direita, nem de esquerda. Ela é pragmática.

Pressionado a apresentar propostas para a geração de postos de trabalho formais, o presidente respondeu que quem cria emprego é a iniciativa privada e sua função deve ser "não atrapalhar", desviando-se da responsabilidade. Disse que tem "pena", mas que não pode fazer "milagre". Ao mesmo tempo, aposta todas as fichas na Reforma da Previdência, sendo que ela não é suficiente para aquecer a economia. Esquece do papel que pode ser exercido pelo Estado nesse sentido.

Jair Messias governa para seu povo escolhido, como já disse aqui. E sem pudores de mostrar isso. Tanto que está defendendo abertamente que agentes de segurança pública tenham condições melhores de aposentadoria. Não entro no mérito se é justa ou não a reivindicação desses profissionais, apenas que eles contam um presidente que, ao menos nas aparências, articula em nome de seus interesses. Enquanto isso, às outras categorias, toda dureza das mudança nas regras.

Bolsonaro teria mais liberdade para sua pauta medieval de costumes e comportamentos se conseguisse reduzir significativamente (e rápido) o desemprego. Afinal, a parte da população que votou por mudanças (e não por fiscalizar o sexo alheio, nem armar as pessoas, muito menos celebrar o trabalho infantil) engoliria isso mais facilmente se o Estado garantisse segurança econômica.

Ele inverteu, acreditando que manter uma base bolsonarista bem alimentada e com energia para sair às ruas é a melhor garantia de proteção ao seu mandato. Optou por manter o país em Estado de campanha eleitoral constante, fazendo com que a principal meta do governo não seja emprego, saúde, educação, combate à corrupção, segurança pública, Previdência Social, mas sua reeleição. Se a campanha, em 2018, foi a mais curta da história recente, durando 45 dias, a de 2022 será a mais longa, e vai durar quase quatro anos.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.