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MPF processa bancos por financiarem desmatamento na Amazônia

Leonardo Sakamoto

31/03/2011 12h24

O Ministério Público Federal ajuizou nesta quinta (31) ações civis públicas contra o Banco do Brasil e o Banco da Amazônia por terem concedido financiamentos a fazendas com irregularidades ambientais e trabalhistas no Estado. O Incra também é réu nos dois processos por ineficiência em fazer o controle e o cadastramento dos imóveis rurais na região. Segundo o MPF, Fundos Constitucionais vem financiando diretamente o desmatamento na região amazônica por causa do descontrole do Incra e das instituições financeiras.

Os processos são assinados por nove procuradores da República que atuam no Pará e podem ter como consequência, caso acolhidos pela Justiça, o pagamento pelos bancos de indenizações por danos à coletividade e até mudanças substanciais na política de financiamento da atividade rural na Amazônia. Entre os pedidos dos procuradores está o de fazer com que os bancos invertam suas prioridades, deixando de emprestar dinheiro para produtores irregulares, implementando política de juros reduzida para produtores de municípios ambientalmente responsáveis e incentivando o licenciamento ambiental das propriedades.

Também foi pedido a realização de auditorias internas nos bancos para checar o tamanho do desmatamento fomentado por esse financiamento a partir de julho de 2008. A regra do CMN determina aos bancos oficiais ou privados que só liberem financiamento para atividades agropecuárias no bioma Amazônia com apresentação do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR), de Licença Ambiental e ausência de embargos por desmatamento ilegal.

A pesquisa envolve empréstimos de R$ 8 milhões concedidos pelo Banco do Brasil e de mais de R$ 18 milhões pelo Basa. De acordo com o MPF, sua investigação, feita por amostragem, encontrou 55 empréstimos com diversas irregularidades ambientais e até casos de trabalho escravo.

Os bancos públicos federais, como o BB e o Basa, e instituições que administram o crédito rural têm a obrigação de não emprestar para empregadores relacionados na "lista suja" do trabalho escravo. Os bancos afirmam que vêm cumprindo essa recomendação.

Dados públicos do Banco Central obtidos pelo MPF demonstram que, entre os anos de 1995 e 2009, as instituições financeiras emprestaram mais de R$ 90 bilhões para atividades rurais na Amazônia Legal. Desse total, mais de 92% vem de bancos públicos. O Banco do Brasil liberou 52,3% dos créditos, o equivalente a R$ 47 bi. O Basa aparece em segundo lugar, financiando 15% do total e injetando R$ 13 bi na Amazônia Legal nos 15 anos examinados.

Segundo nota distribuída pelo MPF-PA: "Desvendou-se, de forma factual, que as propagandas de serviços e linhas de crédito que abusam dos termos responsabilidade socioambiental e sustentabilidade não retratam essa realidade nas operações de concessão desses financiamentos a diversos empreendimentos situados na Amazônia, que em sua maioria são subsidiados com recursos dos Fundos Constitucionais de desenvolvimento e de outras fontes da União".

Se recursos públicos devem ser empregados para o bem público, então o que o Ministério Público Federal apontou é um desvio na finalidade das instituições. O roubo de terras, de força de trabalho e de recursos naturais, adotado como instrumento de capitalização, é usado em larga escala na Amazônia para a implantação de empreendimentos desde a ditadura até hoje.

Historicamente, empreendimentos têm conseguido recursos por intermédio das esferas de governos federal, estaduais e municipais para garantir um nível de capital constante que facilite a sua atuação no mercado. As placas de financiamento de bancos e agências federais de fomento, expostas aqui e ali na porteira das fazendas, em frente a obras de hidrelétricas, no pátio de frigoríficos, provam que o Estado se faz presente na fronteira agrícola para uns, através de incentivos fiscais, isenção de impostos, taxas e subsídios e infra-estrutura, e que há uma política pública apoiando aquelas práticas. Enquanto isso, para outros, Estado só se manifesta, sobre rodas, para libertar trabalhadores ou bloquear áreas de ocorrência de crimes ambientais.

Documentos disponibilizados pelo MPF relativos ao caso:

Pedidos do MPF para a Justiça Federal

Total de crédito rural na Amazônia Legal
Empréstimos considerados irregulares do Banco da Amazônia
Empréstimos considerados irregulares do Banco do Brasil
Íntegra da Ação Civil Pública contra o Banco do Brasil e o Incra
Íntegra da Ação Civil Pública contra o Basa e o Incra

(Com informações do Ministério Público Federal no Pará)

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto