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Sorria! Você está sendo desrespeitado em sala de aula

Leonardo Sakamoto

26/09/2012 13h01

Vivemos uma sociedade vigiada. Isso não é novidade.

Sob a justificativa da segurança – interna e externa – plantamos câmeras em qualquer lugar, rifando nossa liberdade individual. Equipamentos que, no final das contas, acabam sendo usados para tantas outras finalidades que a razão inicial de termos os colocado acaba esquecida.

A paranoia da segurança vai eleger prefeitos que apresentam discursos que beiram o fascismo em todo o país. Muitos deles prometeram a instalação de câmeras em todos os cantos. Outros, que buscam a reeleição, propagandeiam aos quatro ventos que colocaram esses aparelhinhos, tidos como panaceia para os problemas da urbe. Podem até ser úteis em determinados casos, mas geram uma falsa sensação de segurança em outros.

Sorria! Não porque você está sendo gravado. Mas pelo fato de que, assim como a ignorância, a autoenganação também é um lugar quentinho.

Os repórteres Fábio Takahashi e Bruno Benevides, da Folha de S. Paulo, trouxeram a notícia de que 107 alunos do Colégio Rio Branco, um dos mais tradicionais de São Paulo, foram suspensos por um dia por protestar contra a instalação de câmeras de segurança nas salas de aula. Segundo a direção da escola, o objetivo seria aumentar a segurança (?) e melhorar a disciplina (!). Os estudantes, que alegam não ter sido avisados, ficaram sentados no pátio até que houvesse uma manifestação da diretoria – o que não houve.

Para quem pensava que os direitos civil e políticos estariam assegurados neste início de século, garantindo tempo para que nos dedicássemos aos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais, enganou-se. Se não é o Estado causando problemas, são instituições que assumem o seu papel. O direito à privacidade, desde que ela não agrida aos direitos e liberdades de terceiros, deveria ser garantido. Mas, em nome dessa paranoia por segurança (que não brota do nada, mas é decorrência da própria incompetência do poder público aliada a interesses econômicos) e, o pior, em nome da disciplina, enterramos isso.

Disciplina vigiada eletronicamente… Qual exemplo passamos com isso? Que soluções arbitrárias, que ignoram direitos, são viáveis em nome de um valor supostamente maior?

Dada a quantidade de pais que, por serem moídos diariamente no trabalho, não conseguem fazer parte da vida de seus filhos, é natural que essa medida tenha recebido apoio. Se transmitissem pela internet, para todo mundo checar do local de trabalho, imagino que haveria pessoas que comprariam o pacote.

E não me admiraria se me dissessem que os mesmos pais instalam softwares de rastreamento nos celulares dos filhos sem a anuência dos mesmos ou colham fios de cabelo para realizar exames da presença de psicoativos sem, ao menos, tentar uma conversa mais longa com eles.

"Ah, mas crianças e jovens não têm que reclamar, pois não sabem o que é melhor para eles. Têm que aceitar e ponto." E, pelo jeito, nem os pais sabem. O fato é que, nós adultos, somos crianças crescidas, com mais medo que eles.

Colocar câmeras pode parecer mais fácil. Mas isso encerra toda a possibilidade de diálogo sobre direitos e deveres. Enquanto estou sendo vigiado, irei agir como a sociedade espera de mim. E quando não houver câmeras? Ignoro tudo e todos? Que espírito democrático é esse que estamos fomentando?

Este não é o único colégio que optou por essa saída. Meus alunos me contaram, nesta quarta, que outras escolas adotam o mesmo expediente, ou seja, está longe de ser uma discussão localizada. Dentre eles, alguém que era estudante do colégio comentou que, ao final o curso, há os que tentam tocar o terror na escola. Pergunta: isso é consequência da falta de vigilância?

Os alunos do Rio Branco deram um exemplo de civilidade muito maior ao fazer um protesto pacífico do que a diretoria da escola, que não os teria convidado para discutir o assunto. Torço para que outros protestos semelhantes pipoquem em escolas que prefiram o porrete ao diálogo.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto