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Porrada de polícia não dispersa multidão. Ao contrário, faz ela crescer

Leonardo Sakamoto

17/01/2014 17h42

Acompanhe o seguinte raciocínio comigo:

Uma multidão chega em um local, atrapalhando a ordem estabelecida das coisas. Mesmo que o objetivo não fosse esse.

O poder instituído, seja ele qual for, acha uma ousadia isso e nega-se a entender o significado ou a conjuntura daquilo, reagindo de forma irracional, sem pensar nas consequências.

As imagens da violência policial decorrentes disso são transmitidas e repetidas à exaustão.

Determinados grupos que estavam fora da primeira ação resolvem se manifestar contra a resposta violenta do poder instituído, seja juntando-se à ação inicial, seja ressignificando-a, que passa – a partir daí – a ter contornos muito maiores que o do grupo que a começou.

Daí, aspones que fazem as funções de conselheiros reais dos mandatários interpretam a realidade como uma criança de um ano e sem fome interpreta o prato de mingau à sua frente, sugerindo medidas que só espalham o caldo.

De olho na audiência, muita gente, jornalistas de veículos tradicionais ou alternativos, vai retroalimentando o processo, cavando, criando.

O caso chega em Brasília, onde os políticos e aspones do governo e da oposicão reúnem-se para tratar do tema sob a ótica eleitoral.

Moral da história: multidão não dispersa com porrada. Se reproduz. É igual a tentar afastar um gremlin chato com um jato d' água.

Em São Paulo, por exemplo, foi assim, respeitando as devidas proporções e características, na porrada da marcha da maconha em 21 de maio de 2011, na porrada da manifestação do Movimento Passe Livre, em 13 de junho de 2013, na porrada no rolê dos jovens no shopping Itaquera, em 11 de janeiro, entre outras datas.

Em suma, em todos os casos, a reação da polícia foi responsável por aumentar aquilo que ela afirmava que era seu dever coibir. É uma estratégia (em grego, strateegia, em latim, strategi, em francês, stratégie, em inglês, strategy, em alemão, strategie, em italiano, strategia, em espanhol, estrategia…) bem interessante.

O que me leva a crer que parte da polícia e de nossos governantes gostam mesmo é de um bom fuzuê.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto