Por que Eduardo Jorge venceu o debate presidencial
Leonardo Sakamoto
27/08/2014 02h41
Quando postei o título deste post no Twitter, amigos simpatizantes do PT, PSB/Rede e PSDB me enviaram mensagens desabonadoras, afirmando que eu estava querendo rebaixar a política. Reclamaram que um debate presidencial é algo sério demais para o comportamento um tanto quanto "irreverente" do candidato do PV.
Para quem não assistiu ao debate na Rede Bandeirantes, entre a noite desta terça (26) e a madrugada de quarta, saiba que Eduardo Jorge, que não atinge 1% das intenções de voto, de acordo com a última pesquisa do Ibope, levantou bandeiras consideradas polêmicas como a ampliação do direito ao aborto, a legalização da venda psicoativos considerados ilícitos e a ampliação de instrumentos de participação social.
Mas não foram apenas os temas defendidos que o levaram a ser um dos trending topics globais nas redes sociais, mas a forma irônica, engraçada e, muitas vezes, atrapalhada com o qual respondeu questões e se portou no debate.
Alguns podem dizer que ele extrapolou e só fez o que fez porque não tem chances nenhumas de ganhar a corrida presidencial. Um franco atirador. Claro, mas qual o problema? O Pastor Everaldo também não tem chances mas parecia, o tempo inteiro, estar lendo uma folha de cartolina colocada à sua frente.
O fato é que cada um tem que traçar sua estratégia a partir da posição em que se encontra. E, desse ponto de vista, ele incorporou o saudoso Plínio de Arruda Sampaio, repetindo um pouco do papel exercido pelo candidato do PSol nas eleições de 2010: o de grilo falante, apontando o dedo e esticando a corda. E ambos não são Tiriricas – até a candidatura presidencial já contavam com longas trajetórias políticas, inclusive com boa parte delas vinculadas ao antigo PT.
Eduardo conseguiu estabelecer uma empatia com grande parte do público, principalmente entre os mais jovens, rindo dos outros e de si mesmo. Pessoas que têm na TV a sua primeira tela, mas com computador, tablet ou celular como segundo foco de atenção, nos quais a conversa com os amigos correu solta durante o debate. Ou seja, o debate ocorreu na TV, mas ele o ganhou na internet.
Isso independe se você concorda ou não com as pautas que ele defendeu. Independe também se a maioria das pessoas que curtiu, retuitou ou discutiu a sua participação no debate atesta o conteúdo que ele trouxe. Independe se ele foi incoerente, falou besteiras ou foi deselegante. A verdade é que, por várias vezes no debate, um nanico ganhou fortes holofotes e viralizou nas redes. E isso não tem preço. Parafraseando o assessor de Bill Clinton: Não é só o conteúdo, mas a forma, estúpido!
Poderá ser visto como opção do voto de protesto. Não importa se ficará conhecido como o "cara que fala umas groselhas, mas é ponta firme" ou como o "homem que diz umas verdades e é comédia". E desconfio que o PV, que não é exatamente um partido com pautas e alianças progressistas, terá que engolir a estratégia dado o seu sucesso.
Quem conseguir entender essa nova realidade, em que discussões políticas são realizadas, transmitidas, debatidas, validadas, rejeitadas, comentadas e reinterpretadas em tempo real, vai se dar bem. O que significa saber que o riso está diretamente relacionado ao processo de conscientização na internet e fazer política surte mais efeito se for algo tão divertido quanto jogar Candy Crush.
Mas quem achar tudo isso uma grande bobagem, com o tempo, irá virar peça de museu. Ou, no máximo, falar com uma parede.
Sobre o Autor
É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.