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Estão usando seu dinheiro para jogar você contra alunos que ocupam escolas

Leonardo Sakamoto

25/11/2015 12h06

Seria piada se não fosse com nosso dinheiro. O governo do Estado de São Paulo pretende gastar R$ 9 milhões em uma campanha de publicidade para a TV a fim de tentar explicar o porquê de estar fechando escolas, trocando estudantes de outras tantas e mudando a vida de milhões de alunos, pais e mães. O número foi confirmado pela assessoria de imprensa do governo ao repórter Lucas Rodrigues, do UOL Educação.

Com esse valor seria possível bancar o salário nominal, sem encargos, de quase 4 mil professores dos ensinos fundamental e médio, considerando uma remuneração de R$ 2.415,89 (40 horas semanais), por um mês.

Ironia. Gasta-se dinheiro público para convencer a população de uma ação de "reorganização educacional" que objetiva economizar dinheiro.

Em protesto contra essa medida, tomada de cima para baixo (como boa parte da política de educação no Brasil), mais de 150 escolas estão ocupadas por alunos, pais, mães e organizações sociais em todo o Estado.

Estudantes protestam contra fechamento de escolas em São Paulo (Foto: Marlene Bergamo/Folhapress)

O governador Geraldo Alckmin reclamou da natureza "política" das ocupações, o que é bizarro. Pois é claro que os jovens estão fazendo política. O que ele achou que fosse? Que estivessem brincando de casinha? E é isso que torna a história um exemplo internacional: estão tomando as rédeas de suas próprias vidas e lutando por uma educação melhor, o que vai melhorar a sua pólis e as relações entre as pessoas e o espaço em que existem.

A partir do momento em que passarmos a criminalizar a política por conta da náusea causada em nós por políticos corruptos, estamos criminalizando a capacidade de encontrar soluções democráticas para problemas coletivos. Ou seja, o começo do fim.

Vamos ser bem claros: o governo é que aplica uma política questionável ao gastar esse montante de recursos para manter sua agenda e vender-se como um agente da democracia que busca o diálogo e, ao mesmo tempo, ser avesso a uma conversa real. As tentativas de "conciliação" com os alunos são, na verdade, tentativas de convencê-los a saírem das escolas, o que é patético.

Ou seja, o governo parece tentar jogar a opinião pública contra os jovens, criando um ambiente para que a sociedade exija do governo que desocupe as escolas.

Vale lembrar que na última vez que isso foi feito, com os discursos para "desocupar a Paulista" diante das manifestações contra o aumento das tarifas do transporte público em São Paulo em junho de 2013, a polícia se manchou de sangue.

E por mais que a Justiça tenha deixado claro, por hora, que a polícia não pode atuar na reintegração dos edifícios, informações sobre repressão às ocupações, pipocam aqui e ali com relatos de intimidação de alunos, "fichamento" de ocupantes, inícios de confusões.

A autoproclamada "reorganização" (sic) estava sendo feita na surdina, anunciada com poucos detalhes que ficavam sendo repetidos à exaustão como se toda oposição à sua realização se devesse ao fato de que os opositores não haviam entendido a ideia. Porque se "entendessem" facilmente "concordariam".

Os estudantes estão insatisfeitos: ensino ruim, professores e alunos desmotivados, autoritarismo de algumas direções escolares, falta de sentido para a educação (ainda mais em um momento em que os jovens são as principais vítimas do galopante desemprego). Tudo isso com um sentimento de que muitos jovens das manifestações de 2013 andavam relutantes de voltar para a rua, como mostrou uma pesquisa Datafolha.

Eles querem discussão e estão abertos a isso. Querem participar da política, dos destinos de suas próprias vidas, como já deixaram claro em 2013. Mas tanto naquele momento como agora, seguem ignorados nesse pleito.

Em São Paulo, por exemplo, isso teria que adiar em, pelo menos, um ano os planos do governo – coisa que irrita o Palácio dos Bandeirantes.

A depender do que aconteça, essas mais de 150 escolas serão apenas o começo. Pois a disputa não é por edificações, mas pela forma como cidadãos vêm sendo formados pelo Estado. Que os mais jovens estejam discutindo isso, é um alento. Que o Estado e parte da sociedade não percebam isso e os ajude, é paradigmático de que estamos em um momento de mudança.

Que venham os bons ventos.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto