Sua opinião não vale
Leonardo Sakamoto
01/04/2016 08h37
Sua opinião não vale porque você entrou por cotas.
Sua opinião não vale porque você está desempregado.
Sua opinião não vale porque você é feminista.
Sua opinião não vale porque você mora na favela.
Sua opinião não vale porque você não paga muito imposto.
Sua opinião não vale porque você defende uma causa em movimento social.
Sua opinião não vale porque você recebe Bolsa Família.
Sua opinião não vale porque você é ateu.
Sua opinião não vale porque você tem sotaque nordestino.
Sua opinião não vale porque você é gay.
Sua opinião não vale porque você é analfabeto.
Sua opinião não vale porque você é muito jovem.
Sua opinião não vale porque você é índio demais.
Sua opinião não vale porque você é negro demais.
Por isso, criamos o selo de garantia "Opinião que Vale", para ajudar você a entender quem é levado a sério por aqui.
Homens brancos do Sul-Sudeste, acima de 35 anos, ensino superior, classe alta e média alta, heterossexuais, tementes a Deus, que acham que a função do Estado é zelar pela livre iniciativa, os bons costumes e para manter a violência longe. E acreditam no mercado acima de tudo. Ou seja, pessoas razoáveis, racionais e sem ideologia.
O selo já é utilizado em alguns veículos de comunicação, mas pretendemos transforma-lo em lei para facilitar. Se as pessoas soubessem que não estão devidamente preparadas para dar opinião sobre suas vidas, deixariam tudo com quem sabe das coisas.
Aviso: Cuidado, ironia selvagem. Pode morder.
Sobre o Autor
É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.