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Se o STF liberar nepotismo, pode chamar a saideira que o país acabou

Leonardo Sakamoto

13/02/2017 20h49

O prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, resolveu praticar caminhada nos corredores do Supremo Tribunal Federal, nesta segunda (13), para tentar convencer os ministros de que não há mal algum em nomear seu filho Marcelo Hodge Crivella para a Casa Civil de sua administração.

"O Marcelo não é suscetível, nem melindroso. Sabe que a vida pública não é concurso de beleza", disse o pai ao mostrar que ele é um bom menino.

Na quinta (9), o ministro Marco Aurélio Mello suspendeu a nomeação de Marcelo Hodge para o cargo. Afirmou que ao indicar "parente em linha reta para desempenhar a mencionada função", o prefeito acabou por desrespeitar decisão do Supremo Tribunal Federal que determina que nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta até o terceiro grau viola a Constituição Federal. A questão ainda será julgada pelo tribunal, que dirá se libera ou não.

Não é implicância: Mesmo que um parente seja qualificado para uma função pública, permanecerá a dúvida sobre a razão da indicação. E não apenas por uma suposta ajuda à família, mas também por conta da solidez da rede de sustentação do político em questão. Será que o prefeito do Rio confia tão pouco em pessoas fora de seu próprio sangue para não encontrar alguém capaz de executar a tarefa? Ele não consegue cercar-se de técnicos e de outros políticos qualificados e honestos para tanto ou essas pessoas não querem se aproximar dele?

A palavra nepotismo vem do latim "nepote", que significa neto ou sobrinho, e ela começou a ser utilizada para designar os privilégios que os papas concediam a seus familiares.

A prática de irmãos, primos, cunhados garantindo cargos públicos é rejeitada pela sociedade por razões óbvias, mas é uma das expressões mais conhecidas da relação incestuosa e promíscua que a elite brasileira, política ou econômica, estabeleceu com o Estado.

Muitos parlamentares e governantes consideram normal colocar parentes em cargos que requerem confiança e dependem de nomeação.

A solução para esse problema passa por reduzir o número de cargos de confiança, garantindo que o acesso a mais e mais funções se dê por concurso público e não indicação. Cria-se, dessa forma, um corpo burocrático permanente de qualidade, independente do poder de plantão.

Mas isso, que deveria estar pacificado na segunda década do século 21, ao que parece, ainda é visto como "entrave" à governabilidade. E muitos tentam fugir das restrições empregando parentes de outros políticos enquanto esses empreguem seus parentes.

Só por curiosidade: em 2000, um deputado federal defendeu apenas "limitar" o abuso, criando uma "cota" para o número de familiares que poderiam ser contratados como cargos de confiança no serviço público.

"Poder contratar para as funções um ou dois parentes não é escandaloso", afirmou.

Hoje, ele não é mais deputado federal.

Tornou-se o Presidente da República. E está lá até hoje.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto