Deputado acha bom população não ter ideia do que é a Reforma Trabalhista
Leonardo Sakamoto
17/04/2017 16h33
A Reforma Trabalhista, que vai reduzir direitos e precarizar as condições de vida dos trabalhadores, está sendo empurrada goela abaixo sem um debate amplo com a sociedade.
Membros da cúpula do governo federal e parlamentares não se dignam a explicar à população mais pobre suas propostas de mudanças e o real impacto na vida dessas pessoas. Em compensação, estão sempre presentes em encontros com empresários para mostrar que estão fazendo tudo direitinho, conforme o combinado.
Quando acusados de tentar acelerar um processo que deveria contar com participação popular, os líderes do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional dizem que isso não é verdade. E juram de pés juntos que está sendo dado espaço para o debate público sobre a matéria.
Daí, o relator da Reforma Trabalhista na Câmara dos Deputados, Rogério Marinho (PSDB-RN), em evento com empresários nesta segunda (17), num rompante de sinceridade, apenas reforçou o que os críticos ao projeto de lei vêm avisando há tempos: que o governo e seus aliados estão tentando rasgar a CLT com a menor transparência possível.
"A reforma da Previdência nos deu uma espécie de cortina de fumaça. Só se discute a reforma da Previdência, só se fala da reforma da Previdência. Está fora do radar a Reforma Trabalhista. E é bom que seja assim", disse no evento. Assim, sem pudor algum.
Tentar aprovar leis sem que o povo saiba o que está acontecendo para não poderem atrapalhar é algo comum a regimes autoritários. Mas não combina com uma democracia.
É claro que o país precisa de uma atualização de toda a legislação que regula a relação capital e trabalho e não apenas da CLT. Mas, primeiro, o Congresso Nacional deveria reunir todas as leis, instruções normativas, regras, enfim, e simplifica-la, retirando redundâncias e facilitando a vida do trabalhador e do empresário. E só depois buscar os pontos de consenso para começar uma profunda discussão com ampla participação da população, debates pela imprensa, discussões em escolas e empresas. Ou seja, já que estamos rediscutindo o contrato social de compra e venda de mão de obra, que os dois lados possam participar de forma efetiva.
Por exemplo, a proposta que libera o "negociado sobre o legislado" mesmo em prejuízo ao trabalhador, uma das principais propostas da Reforma Trabalhista, beneficia parte do empresariado e dos sindicatos, que terão mais poder para se sobrepor ao que diz a lei. Se um sindicato é forte e honesto, a briga é boa com os patrões. Mas e se não for nem forte, nem honesto? Dar mais poder a sindicatos sem repensar a estrutura sindical brasileira é pedir para que apareçam mais casos de corrupção e de negociatas entre supostos representantes dos interesses dos trabalhadores e patrões.
A massa dos trabalhadores não reconhece, hoje, a legitimidade do Congresso Nacional para realizar reformas que vão mudar profundamente sua vida. Sabem que boa parte dos parlamentares não representam ninguém além de seu próprio umbigo e as empresas que os arrendaram através de doações de campanha e caixa 2.
Muita gente no Congresso Nacional sabe disso. E essa é a razão de atacarem direitos no escuro e nas sombras.
Espero que os eleitores também não tenham pudor de consultar as listas de deputados e senadores que deram seu "sim" às Reformas Trabalhista e da Previdência antes de votarem no ano que vem. Pois, se já estivéssemos em 2018, seria mais fácil uma vaca voar do que alguém que as endossou ser eleito para qualquer caro público.
Sobre o Autor
É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.