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Ao proibir entrevista com Lula, Luiz Fux impõe censura prévia por canetada

Leonardo Sakamoto

29/09/2018 12h45

Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo

Por Eloísa Machado, para o blog (*)

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, a entrevistar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na prisão nesta sexta (28). A decisão foi uma resposta a uma reclamação feita pelo jornal de que a negativa da 12ª Vara Federal em Curitiba em permitir a entrevista representava censura à atividade jornalística e limite à liberdade de expressão. Logo depois, o ministro Luiz Fux suspendeu a decisão de Lewandowski e determinou que, se a entrevista já estivesse pronta, fosse censurada.

"Determino que o requerido Luiz Inácio Lula da Silva se abstenha de realizar entrevista ou declaração a qualquer meio de comunicação, seja a imprensa ou outro veículo destinado à transmissão de informação para o público em geral", escreveu Fux.

"Determino, ainda, caso qualquer entrevista ou declaração já tenha sido realizada por parte do aludido requerido, a proibição da divulgação do seu conteúdo por qualquer forma, sob pena da configuração de crime de desobediência", completou.

Vamos tentar deixar mais claro:

1) Não sei se vocês estão sabendo, mas o Lula está preso.

2) Teve "prende, não prende" (execução provisória da pena é automática?), "solta, não solta" (desembargador Rogério Favreto versus Polícia Federal + juiz Sérgio Moro, num domingo, lembra?) e agora tem o "fala, não fala".

3) Jornais e portais de notícias pediram pra entrevistar Lula. Juíza de execuções, que cuida da execução penal de Lula, disse não.

4) Mas preso tem direito de dar entrevista? Pergunta errada. Quem decide quem é ou não relevante para falar na imprensa é a imprensa. Se a justiça decide antes quem pode ou não falar na imprensa, rola uma coisa chamada censura prévia.

Ah, detalhe. A Constituição veda a censura prévia.

5) Claro que entrevistar uma pessoa privada de liberdade tem condicionantes: a juíza pode decidir o dia, o local, pode restringir a um número de entrevistas, pode restringir o tempo e até equipamentos usados.

Mas não pode vetar, não pode interditar o que a imprensa acha que é relevante.

6) E assim aconteceu entrevistas com Marcola, com Beira-Mar, com Susane Richthofen… Mas não com Lula.

Ah, mas o caso do Lula é diferente. Ah, é? Mais grave? Sob outra Constituição Federal? Poupem a Constituição dessa tristeza, não digam isso, faz favor.

7) O caso: Folha de S.Paulo pede entrevista com Lula. Juíza de Curitiba nega. Folha recorre ao STF através de uma reclamação, alegando que a juíza está desrespeitando a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental número 130, sobre Lei de Imprensa. Lewandowski recebe o caso e dá provimento. Não dava pra fazer diferente: vai lá e veja a decisão da ADPF 130.

8) O Partido Novo entra com uma suspensão de liminar – que é um entulho autoritário – dirigida ao presidente do Supremo Tribunal Federal, falando que a entrevista vai criar desinformação nas eleições.

Entendeu? Informação, uma entrevista a um dos grandes jornais do país, a uma jornalista renomada, vai gerar desinformação.

9) E eis que Luiz Fux, no exercício da presidência do STF, acata essa barbaridade. Barbaridade na forma e no conteúdo.

10) Fux instaura censura prévia na canetada. Não se deixe enganar: não é regulação de matéria eleitoral. Lula não é mais candidato, por decisão da própria Justiça.

Ora, Tribunal Superior Eleitoral decidiu que Lula não poderia fazer campanha com o registro de candidato indeferido, enquanto os recursos eram julgados. Lula então desistiu da candidatura e dos recursos. Ponto. Fernando Haddad agora está sujeito às regras eleitorais, não Lula.

A entrevista teria impacto? Sim. A do Adélio, que tentou matar Jair Bolsonato também? Também. Você acha que ambos deveriam dar entrevista? Acho. Mas a Veja faz matérias para impactar eleições antes e fez novamente agora. Eu sei. Esse é o jogo. A alternativa é censura prévia. Você quer isso? Eu não quero.

(*) Eloísa Machado é professora da FGV Direito SP, especialista em direitos humanos e coordenadora do Centro de Pesquisa Supremo em Pauta.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto