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Palocci vai pra casa. Mas revelou tudo o que sabe sobre bancos e empresas?

Leonardo Sakamoto

28/11/2018 18h34

Antonio Palocci escoltado pela PF após ser preso em 2016. Foto: Rodolfo Buhrer / Reuters

Por dois votos a um, os desembargadores da 8a Turma do Tribunal Regional Federal da 4a Região decidiram que Antônio Palocci poderá cumprir o restante de sua pena em regime domiciliar, com tornozeleira eletrônica, e sua condenação foi reduzida de 12 para nove anos. O motivo foi o acordo de delação que assinou.

Condenado pelo então juiz federal Sérgio Moro por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o ex-ministro ganhou, nesta quarta (28), o direito de ir para casa.

Palocci deve ser um dos maiores arquivos vivos das negociatas nacionais. Mas, até agora, a parte de sua delação que foi divulgada não trouxe nada de novo, além de acusações contra Lula que ainda demandam provas. Soubemos disso, aliás, durante a campanha eleitoral – momento escolhido pelo futuro ministro da Justiça de Bolsonaro e na época ainda juiz do caso, Sérgio Moro, para abrir o sigilo do depoimento.

Os defensores da colaboração premiada apontam políticos como os mais importantes chefes de quadrilha. Mas vale lembrar que empresários moldaram o Estado de acordo com suas necessidades, comprando e vendendo quem fosse preciso, sangrando os cofres públicos, escrevendo e aprovando leis que os beneficiavam. Não são menos responsáveis.

Esperemos que Palocci tenha delatado bancos e empresas do setor financeiro, representantes do agronegócio, das indústrias, do comércio, dos serviços, de nacionais, de multinacionais, enfim, de todas as empresas que fez rir e que o fizeram e a outros rirem. Seria o empurrão que falta para duas importantes reformas: a Política (uma de fato, não o arremedo feito até aqui) e a Tributária. Para chacoalhar de vez o país e dar o reset que a gente verdadeiramente precisa. Para muito além do salto ao desconhecido que estamos dando agora.

Já naquela época, a parte da esquerda que não concordava com o modelo de desenvolvimento do qual Palocci era fiador, tecia longas críticas a ele e ao governo do PT. Mas muitos dos mesmos analistas, políticos e empresários que, hoje, jogam pedra no ex-ministro-quase-ex-presidiário eram os mesmos que saíam em sua defesa, fazendo juras de amor eterno.

Enquanto era ministro da Fazenda e seguia a cartilha do mercado, foi chamado de bastião da sensatez, defensor da moeda, guardião da estabilidade, entre outros elogios proferidos pelos rentistas que encheram os bolsos de dinheiro durante o governo Lula. Para quem não se lembra, o capital – com que ele tinha um relacionamento bom até demais – aumentou seu rendimento bem mais do que o trabalho naquele período.

Palocci, se estivesse interessado em ajudar a reduzir a desigualdade social, teria buscado, por exemplo, o retorno da taxação sobre os dividendos recebidos de empresas por grandes acionistas – cobrança que havia sido derrubada pelo governo Fernando Henrique, cuja ausência faz com que a classe média pague proporcionalmente mais impostos que os super ricos. Ou de implementar um Imposto de Renda realmente progressivo, com alíquotas de até 40% para quem ganha muito e isentar parte da classe média. Não fez nada disso. Pelo contrário, graças também a ele, o Bolsa-Banqueiro foi maior que o Bolsa-Família.

Até onde foi o seu silêncio é uma pergunta de bilhões de reais.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto