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Bolsonaro (32% de aprovação, em queda) pode se tornar refém de Moro (59%)

Leonardo Sakamoto

07/04/2019 11h16

Foto: José Cruz/Agência Brasil

Após quase 100 dias, apenas 32% consideram o governo Jair Bolsonaro ótimo e bom, segundo pesquisa Datafolha. Outros 30% classificam-no como ruim e péssimo – a pior avaliação entre presidentes eleitos para um primeiro mandato desde a redemocratização. Enquanto isso, o desempenho do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, alcança 59% de ótimo e bom no mesmo Datafolha, sendo a figura mais bem avaliada do governo.

Pode-se dizer que isso se deve a Moro carregar o capital acumulado durante a atuação como o principal juiz federal da operação Lava Jato, considerando que o pacote legislativo que propôs contra o crime organizado e a corrupção tem sido alvo de críticas por aumentar a letalidade policial, seguindo em marcha lenta no Congresso. Mas vale lembrar que Bolsonaro, tendo sido eleito com 55% dos votos válidos, ostentava 49% de ótimo e bom em janeiro, passando para 39% em fevereiro e 34% em março, segundo o Ibope. Mesmo considerando que sua função é naturalmente mais desgastante que a de seu subordinado, é uma derrocada que impressiona.

O que acontece quando um ministro, que já era mais popular que o presidente, torna-se ainda maior que ele por conta da queda de aprovação do eleito? Ele continuará servindo feliz e sorridente como pilar de sustentação ao governo e fiador de suas lambanças ao mesmo tempo que toca as pautas de seu interesse? O incômodo gerado mutuamente será resolvido com uma indicação ao Supremo Tribunal Federal em 2021? Se o ministro aprender a fazer política, isso pode significar, lá na frente, o fim da relação ou um apoio forçado para as eleições presidenciais de 2022? Ou o presidente se torna refém do ministro?

Jair Bolsonaro convidou três pessoas para servirem de fiadores de seu governo. Além de Sérgio Moro, colocou Paulo Guedes, à frente do ministério que reúne economia, planejamento, orçamento, indústria, comércio, desenvolvimento e trabalho. E entregou o Gabinete de Segurança Institucional ao general da reserva Augusto Heleno Pereira, que organiza a ala militar. Seja pelo nome, seja pela função que exercem, não saem a menos que queiram.

Com o convite a Moro, Bolsonaro queria, além de reforçar apoio no naco da sociedade do centro à direita, criar um anteparo para que denúncias de corrupção envolvendo seu governo não colassem tão facilmente. Ou seja, usá-lo para "lavagem de marca". Desde então, consegui até que Moro flexibilizasse a opinião sobre a gravidade do crime de "caixa 2", indo contra o que havia dito antes, ao aceitar o perdão do outrora deputado federal e agora ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, diante de "sincero" arrependimento.

Mas Bolsonaro tem feito questão de mostrar que a "carta branca" que prometeu a Moro funciona se ele seguir sua cartilha, não tendo o ex-juiz a liberdade nem para indicar uma suplente de conselho sem a anuência do chefe e de sua militância nas redes sociais, como foi o caso de Ilona Szabó. Nada que gere ruído passa sem o amém do Planalto.

Depois do arranca-rabo público com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, mostrou que ainda engatinha para entender como funciona a política. Mas a sua entrada no Twitter – com a já antológica publicação em que postou uma foto com uma folhinha de calendário  para provar a data – mostra que está disposto a aprender. Para quê? Essa é a grande pergunta a ser respondida em 2021, 2022 ou 2026.

Trincheiras cavadas ajudariam a proteger o governo de ataques, pensou a equipe de Bolsonaro. O problema é que se muros altos cercados de fossos inexpugnáveis criam uma fortaleza também constroem uma prisão. Tudo depende do ponto de vista. Bolsonaro escolheu um nome que não pode demitir, o que faz dele comandante e prisioneiro.

Moro controla a Polícia Federal e o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). Tem acesso a investigações em curso. Como, por exemplo, aquelas que teriam identificado corrupção na apuração da execução da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes. Ou aquelas que analisam as relações de poder da milícia no Rio de Janeiro. Ou ainda as que mapeiam os laranjais usados por políticos do PSL, entre eles o ministro do Turismo, Márcelo Álvaro Antônio.

Até agora, Bolsonaro é refém de sua própria incapacidade gerencial (que coloca pessoas desqualificadas em cargos importantes por sugestão de astrólogos, cria briga de rua com o então ministro Gustavo Bebianno nas redes sociais e é incapaz de entender o que é o presidencialismo de coalizão), mas também dos esqueletos que sua família abriga no armário (das denúncias contra o senador Flávio Bolsonaro ao apoio dado a milícias) e de sua crença que foi ungido para a missão de levar o país de volta ao passado. Ou seja, refém de si mesmo.

A depender do que aconteça daqui para frente, pode se tornar também refém de quem o observa do prédio vizinho, o Ministério da Justiça.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto