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PM é responsável por mortes em Paraisópolis. Resta saber: burrice ou má fé?

Leonardo Sakamoto

01/12/2019 18h34

Foto: Joel Silva/Folhapress

A Polícia Militar de São Paulo é responsável pela morte de nove pessoas pisoteadas, na madrugada deste domingo (1), após uma ação da corporação ter dispersado frequentadores de um baile funk na favela de Paraisópolis. Não foi uma tragédia acidental, como querem vender. A questão é descobrir qual a razão do comportamento criminoso da corporação.

Policiais dizem que, primeiro, foram atacados por pessoas que usaram a multidão como escudo e que frequentadores do baile lançaram objetos contra eles. Mesmo se essa versão fosse verdade, ainda assim a PM teria assumido o risco ao reagir. 

Agentes de segurança pública são treinados para atuar com inteligência e frieza e saber que atirar balas de borracha e bombas de gás e de fragmentação contra um bloco de cinco mil pessoas causa muito, mas muito mais dano à sociedade do que deixar suspeitos fugirem.

As histórias e imagens que chegam, contudo, é de que o objetivo da polícia era reprimir o baile, caçando jovens pelas vielas, distribuindo golpes covardes de cassetete, cercando e impedindo a dispersão dos frequentadores. O objetivo era morte.

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Claro que, para o poder público, uma vida em Paraisópolis vale bem menos do que uma no Morumbi – um dos bairros mais ricos do país que faz divisa com a comunidade pobre. Mas operações descaradamente violentas como essa servem para lembrar que o Estado tem dono.

No mínimo, o que houve foi burrice e barbeiragem. Considerando que a polícia tem longa experiência com bailes funk em São Paulo, sabe que agir contra a massa de frequentadores após iniciada uma festa daquelas dimensões e dificultar que ela se disperse em caso de problema é provocar dor e sofrimento. Sabe, aliás, por experiência própria, uma vez que já fez isso várias vezes.

A justificativa de que "o sangue subiu à cabeça" de policiais e os "tirou do sério" é ridícula, quem a usa não merece a farda. Caso isso tenha sido ordem de superior, alguém precisa ser exonerado. Faz-se necessária uma investigação rápida e que aponte os envolvidos para a devida punição, o que inclui prisão. E que o Estado indenize cada uma das famílias, com um pedido de desculpas – afinal, o governador é um defensor da letalidade policial. E que isso seja ponto de partida para uma mudança de comportamento.

A outra hipótese é a má fé. Perseguição, humilhação e espancamento poderia ser o objetivo desde o início, a fim de reprimir o baile.

Ou oprimir a comunidade. Paraisópolis estava apreensiva desde que o sargento Ronald Ruas morreu após ser baleado na comunidade, em 1º de novembro, enquanto fazia patrulhamento. No dia seguinte, a PM começou uma megaoperação para "combater o tráfico e prender criminosos".

Moradores, com os quais o blog conversou, disseram que o clima estava mais pesado, com abordagens mais violentas. Entre os participantes do baile funk deste domingo, o ato foi visto como "vingança".

Exames nos corpos das vítimas precisam ser feitos e os laudos divulgados para confirmar a causa das mortes. A possibilidade de "desforra" ou de "execução" é sempre mais assustadora porque mostra agentes de segurança agindo como milícia.

Agora, imaginem, se o "excludente de ilicitude", defendido arduamente pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, estivesse em vigor? Com um juiz podendo deixar de aplicar uma pena ao policial que agrediu e matou se o "excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção"?

Perderíamos o fino verniz de civilização que tenta esconder o fato de que ser jovem negro e pobre no Brasil não vale nada.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto