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Leonardo Sakamoto

Orelhas de bispo devem ter queimado neste 08 de março

Leonardo Sakamoto

08/03/2009 19h43

Hoje fui à manifestação do Dia Internacional da Mulher em São Paulo. Milhares de pessoas, muitas delas vestindo o lilás, cor adotada pelo movimento feminista, participaram de uma passeata que saiu da Praça Osvaldo Cruz, no começo da avenida Paulista, e foi até o Monumento às Bandeiras, no Parque do Ibirapuera. Mas ao invés de escrever sobre o evento, achei mais pertinente postar o texto do Blog Viva Mulher, da jornalista e ativista Maíra Kubik Mano:

As orelhas do arcebispo devem ter queimado 
Acordei cedo para participar do ato do Dia Internacional das Mulheres em São Paulo. Não estava lá muito animada, admito – dor-de-cabeça, gripe e dois dentes do siso arrancados 48 horas antes colaboraram para o meu estado de espírito. Mas respirei fundo, vesti uma camiseta lilás e fui me juntar às milhares de mulheres que lá estavam. 

"Nós não vamos pagar por essa crise" era o tema principal da manifestação, conforme divulgava o panfleto assinado por dezenas de entidades e organizações. O bloco inicial do protesto lembrava justamente a situação precária das mulheres trabalhadoras nesse momento de colapso financeiro internacional.

Contudo, a questão mais marcante da manifestação foi a legalização do aborto. O tema, que já é muito polêmico, ficou mais quente ainda essa semana com o caso da garota pernambucana grávida de gêmeos após ser estuprada pelo padastro. Para quem não acompanhou o triste episódio, a criança de apenas 9 anos pôde interromper voluntariamente a gestação com autorização da justiça, pois se encaixa em duas exceções permitidas pela lei brasileira: estupro e risco de morte da mãe. Porém, depois do procedimento, os médicos responsáveis e a mãe da menina foram simplesmente excomungados pelo arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho.

Bem, o arcebispo deve ter sentido suas orelhas queimando hoje de manhã. Ele foi, sem dúvida, a figura mais criticada de todo o ato. "Eu é que excomungo esse arcebispo", gritou no carro de som uma das liderenças das Católicas pelo Direito de Decidir. Foi ovacionada pelas manifestantes.

No encerramento do protesto, algumas mulheres subiram no Monumento às Bandeiras, em frente ao Parque do Ibiraquera, carregando uma faixa com os dizeres "Não à criminalização das mulheres. Legalização do aborto já!" 

Foi bonito. 

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.