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Acusado pela morte de Irmã Dorothy é preso novamente

Leonardo Sakamoto

09/04/2009 16h04

No ano passado, eu havia escrito que a decisão judicial que inocentou o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, acusado de ter encomendado a morte da missionária Dorothy Stang, em fevereiro de 2005, em Anapu (PA), mantinha a licença para matar na Amazônia.

Contudo, a notícia de que ele se entregou hoje, em decorrência da anulação de seu julgamento na última terça, é um alento frente a uma enxurada de notícias ruins, de violência no campo e desrespeito aos direitos fundamentais de trabalhadores rurais e populações tradicionais. Há alguns dias por exemplo, ruralistas soltaram um manifesto na cidade de Marabá, não muito distante de Anapu, acompanhados de seus parlamentares. Latifundiários exigem que a lei seja cumprida contra ocupações de sem-terras, ignorando que eles grilam, desmatam, escravizam.

A história do assassinato da irmã Dorothy ocupou o noticiário nacional e internacional durante um bom tempo. No primeiro julgamento, ele havia sido condenado, depois, devido a mudanças nos depoimentos de testemunhas, o juri o liberou por cinco votos a dois. Fogoió, o pistoleiro executor, mudou o testemunho e disse que fez tudo sozinho, da sua própria cabeça, ao contrário do que afirmou nos outros julgamentos. 

A sociedade ficou chocada e houve recurso. O depoimento em vídeo do matador, usado como prova de defesa, foi considerado inválido. Agora, haverá um novo julgamento e esperamos que neste "melhor de três", a Justiça seja feita.

Enquanto isso, proprietários rurais ou grileiros que acreditam deterem o monopólio de violência em regiões em que o poder público é cooptado, subjulgado ou parceiro do poder econômico, apesar de manterem sua licença para matar, ficam preocupados. "Que tempos são esses em que há chance de nós, donos de terra e de poder, irmos para a cadeia?"

Vitalmiro Bastos de Moura continua na "lista suja" do trabalho escravo – cadastro oficial do governo federal que mostra quem cometeu esse crime em suas propriedades. Bancos públicos, algumas instituições financeiras privadas e empresas que assinaram o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo evitam relacionamento com os listados. Bida, como é conhecido, foi flagrado com 20 escravos na fazenda Rio Verde, em Anapu (mesma cidade em que Dorothy foi morta), que desenvolve criação de bovinos. A fazenda foi desapropriada apenas no ano passado. Ou seja, tem gente que financiou as atividades ilícitas de Vitalmiro. Direta ou indiretamente. Mesmo após ele ter sido apontado como mandante.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.


Leonardo Sakamoto