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Leonardo Sakamoto

Aldo Rebelo critica demarcação e leva Troféu Frango

Leonardo Sakamoto

20/03/2009 18h45

Brasília – O Supremo Tribunal Federal decidiu, por 10 a 1 (esse um sendo, como já esperado, o polêmico ministro Marco Aurélio Mello), manter a demarcação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, no Norte de Roraima.  Uma boa decisão judicial que é um alívio frente a uma enxurrada de más notícias para quilombolas, ribeirinhos, caiçaras, camponeses, sem-terra e indígenas que estampam o notíciário diariamente. E, é claro, nem tudo são rosas, uma vez que foram impostos condicionantes que podem atrapalhar a demarcação ou ampliação de outras áreas indígenas. O olho vai ter que permanecer bem aberto. Ainda mais quando o tiro pode sair de onde menos se espera.

O deputado federal Aldo Rebelo (PC do B – SP) divulgou uma nota repudiando a decisão, dizendo que ela agride o interesse nacional e projeta incertezas quanto à unidade da nação. Afe…

É notória a boa relação do ex-presidente da Câmara com os militares. E sabe-se que há muita gente nas forças armadas cuja mentalidade não avançou desde a Guerra Fria, ostentando aquela paranóia da invasão estrangeira ou de que as terras indígenas vão se tornar países independentes por estarem perto da fronteira. Como se a experiência da reserva Ianomâmi, bem maior e fronteiriça, não tivesse mostrado o contrário. E como se as forças armadas não tivessem livre acesso a qualquer parte do território nacional.

A imprensa, como a Folha, soltou a nota, da qual reproduzo alguns trechos:

"O Supremo abre um precedente para que sejam implantados no Brasil um Estado multinacional e uma nação balcanizada, pois confere a tribos indígenas que fazem parte do povo brasileiro o esdrúxulo status de minorias apartadas do todo nacional, com prerrogativas negadas a outros estratos que há cinco séculos amalgamam a formação social do país."

"O respeito aos direitos dos indígenas não pode implicar o esbulho dos não índios que há muito tempo fincaram a bandeira do Brasil naquela região".

"Os índios beneficiados foram isolados da nação. Os índios e não índios prejudicados podem recorrer à resistência não violenta na defesa de seus direitos históricos. E o Congresso Nacional, última instância da soberania popular, tem o dever de reparar este erro calamitoso do Executivo e do Judiciário."

Claro! É notório por todos que os homens brancos e arrozeiros já habitavam Roraima antes da chegada das tribos…

Garantir mínimos direitos aos povos indígenas, que amargaram séculos de genocídio, não os isola do resto da nação. Pelo contrário, decisões como essa, por mais que não sejam perfeitas, ajudam a torná-los, de fato, brasileiros. O que mais entristece não é examente a posição do deputado, uma vez que ele tem o direito de falar o que quiser. Mas os argumentos que usa são de lascar.

Daria para tecer milhares de caracteres apenas sobre esses três parágrafos. Mas esse tipo de paranóia não vale os pixels.

Este blog criou anos atrás o tosco Troféu Frango, para premiar as bizarrices em geral.  Hoje, Aldo leva o Frango para casa.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.